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Lila, o zagueiro sorriso

Foto: Reprodução

Articulista

Jonas Santana

Uílames com U! Não tem nada de vê dáblio. Não é Wiliams ou Wilams!! Era assim que Lila corrigia seu nome toda vez que alguém pedia para soletrar.

O parceiro de zaga de Todo-Duro nos jogos de domingo era um “gentleman” no seu dia a dia. Pedreiro de profissão, sabia manejar como ninguém a sua ferramenta de trabalho: a colher.  Assim como sabia manejá-la também na hora das refeições. Todos admiravam a sua disposição no almoço onde se escondia atrás do prato, justificando-se que os esforços da profissão exigiam “sustança”.

Era um verdadeiro artista, principalmente quando calçava as chuteiras, com meiões levantados até os joelhos (a moda não é nova), camisa para dentro do calção (naquela época era assim, os jogadores andavam sempre alinhados, salvo um ou outro mais “rebelde”), barba feita na navalha (quem lembra?), bigodinho fino simetricamente delineado e cabelo esticado no “henê”. Imagina isso, num camarada de quase dois metros de altura, largo como um guarda roupa em cima e estreito como um canudo embaixo. Seu formato peculiar lhe auferia uma vantagem sobre os atacantes. Passavam eles ou a bola, nunca ou, muito raramente, os dois.

E ainda tinha o detalhe do dente de ouro, e seu sorriso sempre branco com o dente de ouro reluzindo era sua marca registrada.

Nosso atleta era verdadeiramente um artista. Da vida e da bola …

De uma por ter conseguido sobreviver e ter uma profissão e da bola por se sobressair no meio do futebol amador a ponto de ser chamado para jogar em diversas equipes, mas como ele mesmo dizia, “futebol não dá camisa e tenho dois meninos pra sustentar”.

Assim era, o nosso Lila, quarto-zagueiro e dos bons que cansou de deixar adversário na beira do campo, seja pela força física (uns batiam nele e simplesmente caiam), seja pela técnica refinada, que lhe valeram comparações com o célebre Domingos da Guia, com Bellini e tantos outros que desfilaram seu talento nos gramados brasileiros. Dir-se-ia que, nosso craque era uma mistura de estilos, o que lhe valia brados da torcida quando saia todo lampeiro com a bola dominada e dava prosseguimento ao jogo.

Mas Lila também não escapava das falhas comuns a todo artista da bola. Contam que numa ocasião, num jogo em que Litinho, ponta-direita habilidoso e veloz, partiu com a bola dominada, quase na marca de escanteio o nosso atleta alçou seu corpanzil num carrinho malabaríssimo, com as pernas finas esticadas em direção às canelas do adversário. Ocorre que o atacante, muito ágil e veloz deu, num átimo, um pulo que fez com que Lila deslizasse campo afora e derrubasse alguns torcedores que estavam à beira do gramado.   

De outra feita, esta digna de registro, ocorreu num lance que se diria cômico, se não fosse tão bizarro.

Dada sua qualidade e altura, nosso craque era também exímio cabeceador e muitas vezes sacramentou a vitória do time quando os chutes de Nêrroda ou   Vevé, ou ainda Zé Rosca não eram suficientes ou terminavam em tento. E foi numa cabeçada dessas que o episódio aconteceu.

Lance na área e Lila sobe para cabecear!!! Expectativa geral, e enquanto a bola seguia sua trajetória com a força de um torpedo toda a plateia se voltava para o zagueiro que, abaixado e alheio ao jogo procurava freneticamente sua dentadura.  Descobriu-se aí que ele era banguelo e que o dente de ouro fazia parte do seu patrimônio. Naquela cabeçada fatídica alguém o empurrou e ele, com o impulso dado, projetou sua dentadura no gramado.

Depois desse jogo nosso zagueiro passou alguns dias sem sorrir. Dizem que depois estudou e se tornou protético, tendo inclusive um filho dentista.

Até sexta que vem.

Jonas Santana Filho

Gestor e consultor esportivo, escritor, professor, funcionário público e amante do futebol jonassan40@gmail.com

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